Com vocês, a princesa Demi da Krósvia!
Parecia
uma novela de época. Só trocaram as carruagens por automóveis. Mulheres em seus
melhores trajes, empregados por todos os lados e homens, bem, de preto.
A
caravana era grande: um carro com tia Marieva e família, outro com o casal
Muriev, Irina e o assessor de Andrej, cujo nome eu não havia guardado ainda,
além do nosso, digo, o que levava meu pai, Selena, Joe e eu.
Sim.
Eu estava imprensada entre Selena e Joseph. Claro que aquela posição foi minuciosamente
orquestrada por minha amiga maquiavélica e fiquei me questionando por que meu
“quase irmão” não saíra direto do apartamento dele.
Tudo
bem que a visão era das melhores. Ele até tinha domado a juba, embora
despenteado fosse o estilo ideal para ele.
Mas
o que realmente estava me tirando do sério e me ajudando a não pensar na
cerimônia que me aguardava a poucos quilômetros dali era a perna direita de Joe
pressionando minha perna esquerda, com apenas o tecido da calça dele servindo
de barreira entre nós.
Como
se não bastasse, devido a seu avantajado tamanho, ele precisou passar o braço atrás
de minha cabeça e posicioná-lo sobre o encosto para não ficar todo espremido.
Com isso, seu perfume subiu até minhas narinas ultrassensíveis, o que foi
suficiente para eu ter um flash bastante vívido do sonho que tivera na noite anterior.
Como eu poderia ter esquecido?
Foi
assim:
Joe
e eu estávamos na Caverna do Pirata, mas dessa vez fomos até lá para mergulhar.
Usávamos roupas leves — short e camiseta —, mas eu tinha consciência do biquíni
por baixo de tudo.
Caminhamos
calados sobre as pedras, só que de mãos dadas. E nossos dedos estavam entrelaçados.
Percebi que isso fazia uma diferença enorme.
Ao
entrarmos na caverna, Joe disse que eu precisava me preparar para nossa
primeira aula. Portanto, eu deveria colocar um macacão de mergulho. Por sorte,
ele havia levado dois dentro da mochila que se materializou nos ombros dele. Atirou
o traje para mim e começou a se despir para vestir seu próprio macacão. Senti
um perfume amadeirado quando sua camisa voou até o chão e minha boca ficou seca
de repente. Joseph estava na minha frente, só de sunga. Então, ele ordenou que
eu me apressasse e vestisse logo meu macacão, pois o tempo dele era curto.
Obedeci
a ordem, morrendo de vergonha de ficar só de biquíni. Pedi que ele olhasse para
o outro lado e Joe me atendeu. Mas só em parte. Foi só eu tirar o short que ele
quebrou a promessa e me encarou. Primeiro, deu uma boa olhada em meu corpo.
Depois, cravou os olhos nos meus. Fiquei roxa.
Deu
um passo, depois outro, devagar, até ficar a um palmo de distância de mim.
Minha respiração perdeu a regularidade e ficou pior quando Joe se inclinou.
Fechei os olhos, pois sabia que o beijo era uma questão de milésimos de segundo.
De
repente, eu sabia que estava sonhando.
Sabe
aquela sensação? Mesmo assim, eu queria aquele beijo mais do que tudo no mundo.
Mas não aconteceu. Nem no sonho. Claro que acordei na hora H e estraguei tudo.
Que ódio!
Olha
só a que ponto cheguei. Agora, fico desejando ser beijada por Joe, acordada ou
não. Será que existe remédio para obsessão?
Senti
seu olhar desviando-se de vez em quando em minha direção. Algo me dizia que minha
perna roçando na dele não distraía só a mim.
Selena
também estava lutando para se conter.
Eu
previa sua ânsia de dizer algo. Então, adiantei-me, surpreendendo todo mundo.
—
Selena, falei com o Nick outro dia. Ele queria saber que dia eu volto para BH.
— Fiz questão de pronunciar cada uma daquelas palavras em inglês, só para
Joseph escutar e ficar sabendo que ele não era o único que tinha o direito de
esfregar a namorada na nossa fuça.
—
É mesmo? — Selena se sobressaltou. Pareceu surpresa. — Pensei que o lance entre
vocês tivesse minguado.
Joe
se remexeu, mudando a posição do braço. Agora ele estava ao lado do meu, pressionando-o
como se quisesse o espaço só para si . Ô, Selena, me ajuda
aí! Joseph pregou o olhar em mim, aguardando minha resposta. Já
que eu tinha começado, o jeito seria ir até o fim.
—
Bom, se depender do Nick, acho que não — esnobei.
—
Tem certeza? — indagou Selena, sendo irritante ao extremo. Que
amiga eu fui arranjar.
—
Como assim? — Já estava mais do que na hora de eu entender por que Selena
resolvera ser tão do contra em se tratando de Nick e eu. — Você está sabendo de
algo que não sei?
Joseph
pigarreou. Estava se divertindo às minhas custas. Ai, que ódio! E eu querendo
fazer ciúmes nele, nem que fosse só um pouquinho...
Andrej
se ajeitou no banco da frente. Até ele queria ouvir a resposta de Selena. Dava
para a situação ficar pior? Para que fui provocar, meuDeus?
—
Bom... — começou ela, hesitante. — Você não quer conversar sobre isso depois?
Transferi
o olhar de meu pai para Joe, tentando me decidir. Se eu fosse sensata, acataria
a proposta dela e deixaria o papo para mais tarde — ou para outro dia. Mas quem
disse que sou?
—
Fala, Selena.
Primeiro,
ela tossiu. Na verdade, forçou a tosse. Em seguida, olhou para Joseph, buscando
cumplicidade. Por mim, Selena poderia dizer que Nick saía cada dia com uma
garota diferente no Brasil, desde que ela parasse de olhar para Joseph daquele
jeito!
Opa!
Que droga de pensamento fora aquele?
—
Chegamos! — exclamou Joe, apontando com o indicador os fundos do Palácio de
Perla.
Lógico
que todas as atenções foram desviadas de mim para o prédio — e foi melhor assim.
Expor minha vida nada amorosa na frente de Joseph
seria, no mínimo, humilhante.
Selena
soltou o ar como se fosse um balão furado. Mais do que nunca, eu tinha certeza
de que as notícias sobre Nick não prestariam. Não mesmo.
Assim
que o carro estacionou na garagem do palácio, constatei que meus batimentos
cardíacos deviam estar como os de um corredor dos cem metros rasos. Claro que
era por causa da situação e zero devido a Nick. Quer saber? Nada que Selena
pudesse me contar teria importância, pois eu não gostava mais dele.
Estávamos
prestes a seguir até o elevador quando Joseph segurou meu braço e me fez parar.
Selena olhou para a cena e decidiu não interromper, nem deixar que alguém
fizesse isso. Manteve o ritmo e levou Andrej consigo. Por algum motivo, meu pai
achou que não tinha nada de mais eu ficar para trás com seu enteado.
—
Que foi agora? — Usei um tom carregado de impaciência, só para disfarçar o
nervosismo.
Joseph
estreitou o olhar, que não se dirigia a mim. Ergueu uma das mãos e tocou o pingente
em meu pescoço sem nem sequer encostar em minha pele. Achei o gesto bastante
calculado, por sinal.
—
Como foi que conseguiu isso? — ele questionou, ao mesmo tempo em que ficava traçando
os contornos da rosa de diamante.
—
O Andrej me deu. — Fiz questão de empinar o nariz. Se ele pretendia me acusar
de roubo ou coisa parecida, encontraria uma resistência hercúlea.
Mas
Joe apenas balançou a cabeça, bem de leve, em transe.
—
Foi da minha mãe — disse. Ainda sem me olhar. — Mas primeiro foi da mãe do
Andrej, sua avó.
—
Eu sei — murmurei.
Queria
saber se ele havia ficado chateado. Queria perguntar como era a sensação de
viver sem a mãe, pois eu não poderia nem imaginar ficar sem a minha. Queria
mergulhar meus dedos nos cabelos dele e consolá-lo. Sei lá! Queria ser algo mais
que uma simples turista na terra dele, a quem ele era obrigado a tolerar por
consideração ao rei. Queria... queria tanto...
—
Ficou bem em você — concluiu, retirando a mão do colar.
—
Joe, eu...
—
Está atrasada — ele completou. — Venha. Todo mundo está esperando você.
Literalmente,
o mundo inteiro.
Eu
não fazia ideia. Poderia até ter previsto, mas jamais dimensionaria com
exatidão o tamanho daquilo. Não estou falando do Palácio de Perla nem das
proporções de seus aposentos. Refiro-me ao número de pessoas que estavam
esperando pelo pronunciamento de Andrej, dentro e fora do palácio, e à
importância que isso tinha para a população da Krósvia.
Entramos
juntos — Andrej, Joe e eu — no gabinete do rei, enquanto os demais membros de nossa
comitiva foram instalados numa sala de estar, com direito a um coquetel
maravilhoso e uma televisão gigantesca, conectada no maior canal do país, de
onde o pronunciamento seria transmitido.
Todo
mundo decidiu que me beijar me deixaria mais calma, e minha mãe acabou batendo o
recorde. Sentei-me toda dura na ponta de uma poltrona, mal ouvindo o que meu
pai e Joseph conversavam. Nesse meio-tempo, um homem que vestia um terno preto,
com um microfone de apresentador de TV, entrou e ficou dando instruções para
Andrej, tudo em krosvi. Meu pai só concordava, mas depois traduziu tudo para mim.
—
Chegou a hora, Demi. Preciso ir. Daqui a pouco a Irina vem chamar você. Vou
estar na sala ao lado. Como eu disse, não vai precisar dizer nada. Por isso,
tente ficar calma, certo?
Impossível.
Seria impressão ou minha barriga estava começando a doer?
Ah, não! Por favor, intestino, colabore!
—
Joe, fique com ela. E, quando a Demi for chamada, quero você junto de nós o
tempo inteiro. Entendido?
—
Sim. Vou cuidar para que nossa Demizinha aqui não desmaie nem saia voando pela
janela — disse ele, cheio de graça.
Andrej
sorriu. Joe tinha dito o que ele queria escutar.
Juntei
uma mão na outra e esfreguei-as com força. Havia pouco mais de um mês, era uma garota
normal que pensava que o auge de sua vida seria a viagem à Europa que pretendia
fazer quando se formasse. Na televisão, nunca sonhara aparecer, a não ser por
meio dos vídeos caseiros que fazia com sua câmera digital — e com aquelas fitas
de VHS, quando era criança. Entrar num castelo de verdade? Só se ele fosse
aberto à visitação pública. Bater papo com um rei? Talvez o Rei Momo no
Carnaval do Rio de Janeiro. E nunca, jamais mesmo, essa garota fora chamada de princesa
na vida, exceto pelo projeto de namorado chamado Nick. Mas isso não contava.
Senti
dedos longos e ásperos procurando os meus. Eu não esperava que Joseph fosse se aninhar
a meu lado, nem que tivesse intenção de segurar minha mão. Levei o maior susto,
embora soubesse que era um gesto inocente, tranquilizador, sem segundas
intenções.
Deixei
que ele fosse meu apoio e não senti vergonha ao me recostar nele, minha cabeça descansando
confortavelmente em seu peito. Joe reagiu fazendo carinho em meus cabelos com a
outra mão.
Suspirei,
mais relaxada do que deveria, vamos combinar.
—
Eu ainda não disse que você está linda — elogiou ele, devagar. Sua voz saiu
distorcida devido à nossa posição.
—
Não — concordei, adorando estar sendo paparicada por Joe pela primeira vez.
—
Está linda, Demi — repetiu, com mais ênfase. — Uma princesa!
—
Não tem mais raiva de mim? — indaguei, incapaz de olhar em seus olhos.
—
Nunca tive raiva de você — rebateu, segurando-me nos ombros para me encarar.
—
Como não? Vai dizer que eu imaginei todas as vezes que você foi rude comigo?
—
Não — reagiu. — Mas não era por ter raiva de você.
—
Então, era por quê?
—
Demi, venha! — Irina interrompeu. Que droga! Eu estava prestes a ter uma
revelação. Por que comigo as coisas sempre pareciam ficar pela metade? Mais
cedo, com Selena e a história sobre Nick. Agora, com Joe.
Fui
levada às cegas até a sala de imprensa, a tempo de ouvir meu pai anunciar em
krosvi e, depois, em inglês:
—
Quero que todos conheçam finalmente minha filha, Demetria Devonne Lovato
Markov, a princesa Demi da Krósvia.
Por
pura falta de iniciativa da minha parte, Joe me puxou consigo. Minha aparição
na frente dos jornalistas provocou o caos. Todos começaram a falar ao mesmo
tempo e flashes brilhantes espocaram diante
de mim como se eu fosse a nova sensação de Hollywood.
Sorri
timidamente, sem saber o que fazer. Sorte que Andrej segurou meu braço e me fez
ficar entre ele e Joe para que os fotógrafos pudessem nos fotografar à vontade.
Então, as perguntas recomeçaram, algumas em krosvi, outras em inglês e até em
português!
—
Demi, como você se sentiu ao saber que era filha do rei Andrej?
—
Demi, como está sua vida depois de ter recebido essa notícia?
—
Demi, de uma universitária comum a uma princesa. Fale um pouco sobre essa
reviravolta.
—
Demi, você pretende ficar definitivamente na Krósvia?
—
Demi, Demi, Demi!
Minha
cabeça deu uma rodada legal e minhas pernas perderam a rigidez. Gente, eu ia
desmaiar na frente daquele mundaréu de jornalistas, em rede nacional — e
internacional também —, pagando o maior mico em minha primeira aparição
pública.
Mas
Joe envolveu minha cintura com o braço e apoiou meu corpo no seu, mantendo-me
de pé, enquanto Andrej solicitava:
—
Amigos, por favor, vamos deixar as perguntas para outra ocasião. Demi está
cansada e ainda não entende o krosvi. Prometo marcar uma coletiva na semana que
vem e então vocês poderão perguntar à vontade, certo?
Ouvi
inúmeras reclamações, mas senti que, de certa forma, eles estavam satisfeitos.
A notícia era quente e eu fiquei parada diante deles por tempo suficiente para
que fizessem fotos e mais fotos.
—
Só mais uma pergunta! — ouvi alguém gritar. — Demi, você e o Joe Jankowski são irmãos
ou namorados?
***
A
água de minha banheira tinha a temperatura ideal, tanto para relaxar meu corpo
quanto para aliviar as dores musculares. Do ombro aos dedos do braço direito,
tudo latejava de tanto acenar para as pessoas na rua. Meus músculos faciais
ficariam uns três dias sem voltar para o lugar, pois eu grudara no rosto um
sorriso que não me abandonara ao longo de todo o trajeto pelas ruas de Perla.
Aconteceu
também de, a certa altura, eu ficar com enjoo. Sou um pouco intolerante a
passeios em veículos automotores que durem mais de meia hora e não atinei que
deveria tomar um Dramin antes de me enfiar no conversível que nos levou para
cada canto daquela cidade. Mas consegui me segurar e não vomitei, o que teria
sido o fundo do poço para mim.
Joseph
passou todos os segundos do malfadado desfile praticamente agachado no banco de
trás. Até que foi engraçado — e prazeroso — vê-lo vermelho de vergonha por
estar naquela situação um tanto quanto constrangedora. Pelo menos, não era só
eu que estava pagando mico.
Mas
nem tudo foi um martírio. Confesso que quase cheguei às lágrimas mais de uma
vez — bem mais, aliás — em diversos momentos:
1.
Na sacada do palácio: tive medo de levar uma pedrada ou um tiro de escopeta
assim que encarei a população krosviana, a imprensa e os turistas do alto da
sacada do Palácio de Perla. Depois do episódio da coletiva com os jornalistas,
quando fiquei na maior saia-justa devido à pergunta ordinária que um repórter fez
(falo mais sobre isso depois), achei que todo o restante seria um desastre.
Portanto, qual não foi minha surpresa ao enxergar a multidão acenando para mim,
aos gritos, como se eu fosse uma celebridade das mais amadas! Tinha gente
abanando lencinhos e a maioria empunhava com o maior orgulho a bandeira da
Krósvia, daquelas feitas de papel e palito de madeira. Não fui apedrejada. Pelo
contrário. Recebi sorrisos, lágrimas, beijos enviados ao vento, tudo isso
entremeado por um coro arrepiante: “De-mi! De-mi! De-mi!”. Foi lindo e mágico.
Mais tarde, vi a cena com olhos de espectadora — baixei um vídeo no Youtube — e
a classifiquei como surreal.
2.
No centro de Perla: quando o príncipe William da Inglaterra se casou com a
plebeia Kate Middleton, eu nem quis ligar a TV para não ser mais uma brasileira
a dar ibope a uma história que não era nossa, mas que estava sendo tratada como
se fosse. Achei ridícula toda a atenção que a imprensa mundial dispensou ao
fato e, deliberadamente, tive um ato de rebeldia. Durante a transmissão, passei
o dia estudando e trabalhando, como se nada estivesse acontecendo. Para mim,
não estava mesmo. Mas não pude ignorar os flashes
que passaram mais tarde no telejornal noturno, nem as fotos
que saíram em todos os periódicos do dia seguinte. E pensei que o tchauzinho
armado de Kate, enquanto desfilava de carro pelas ruas de Londres, fora, no
mínimo, artificial. Mas, coitada, como fui preconceituosa! É difícil ser
natural numa situação dessas. Embora as câmeras tendam a focalizar o objeto
famoso — no caso, Kate —, por trás delas, há milhares de pessoas com um único
objetivo: demonstrar sua aprovação e respeito por aquela que está no veículo.
Foi o que eu vi de meu ponto de vista e isso me emocionou de verdade. Não sei
se meu tchau saiu artificial ou não, mas garanto que meus sentimentos foram
100% sinceros.
3.
No estacionamento do palácio: após duas horas de tchaus e sorrisos, nosso
conversível finalmente estacionou nos fundos do palácio. Foi um alívio. Nada se
compara ao que senti assim que desci do carro e pisei no chão firme: leveza,
sensação de dever cumprido, êxtase. Andrej, Joe e eu fomos recebidos por uma
salva de palmas dos funcionários do Palácio de Perla, que entregaram um buquê de
rosas para mim. Tive que chorar — de novo.
4.
Na sala de estar do Palácio Sorvinski: fui recebida com honras de... bom, de
uma princesa ao retornar para casa. Não só por minha querida família brasileira
e minha melhor amiga, mas também por tia Marieva e seus filhos, além dos
empregados do castelo. Minha mãe e minha avó choravam copiosamente, mas quem me
surpreendeu mesmo foi Karenina. Com lágrimas nos olhos, ela me abraçou e disse
que me considerava uma filha e que gostaria de me dar um presente muito caro e
maravilhoso, mas tudo o que tinha era uma cesta de pães de queijo e mousse de
chocolate meio amargo. Derreti.
***
Saí
do banho e me enrolei num roupão. O baile para convidados especiais estava
marcado para as 9h da noite. Então, eu tinha um tempo só para mim. Se bem que
Selena não tardaria a aparecer, pois só tinha ido tomar um banho também. Minha
avó e minha mãe retornaram ao hotel, mas estariam de volta na hora do baile.
Adivinha quem ficou de trazê-las? Isso mesmo: Joe.
Conectei-me
à Internet e fui à caça de notícias sobre minha cerimônia de apresentação. Nem
me dei ao trabalho de procurar os sites de notícias da Krósvia. Entrei direto
nos brasileiros, rezando para as coisas estarem na maior calma e que a notícia
de que uma brasileira era princesa na Europa fosse só uma brisa.
Ô
ilusão! Minha foto estava na primeira página de todos os sites, em vários ângulos
e cenários diferentes. As manchetes:
“Rei
da Krósvia apresenta filha brasileira” — no terra.com.br
“Princesa
brasileira encanta população de país europeu” — no globo.com
“Universitária
mineira é filha do rei Andrej Marcov, da Krósvia” — no em.com.br
“Princesa
brasileira esbanja simpatia e bom gosto na Krósvia” — na caras.uol.com.br
Bom
gosto? Eu? Tive que rir. Mas fiquei realmente muito chocada com a quantidade de
matérias sobre mim. Eram tantas que não consegui ler todas. Algumas publicaram
até uma minibiografia, revelando informações que passavam longe da realidade,
tipo, que eu era muito popular na faculdade e que meu pai me achara com a ajuda
de um detetive. Bom, só se o Facebook tivesse mudado de nome.
Fiquei
apreensiva ao ver minha mãe na boca da mídia também. Por um lado, era até uma divulgação
positiva para o buffet. Em compensação, alguns veículos de comunicação pegaram
pesado, referindo-se a ela como se fosse a bruxa má na história da princesa.
Sacanagem. Andrej teria que reparar isso.
—
Amiga — Selena disse, entrando em meu quarto —, já recebi um monte de mensagens
e ligações do pessoal de BH. Está todo mundo chocado!
Segui
o exemplo dela e chequei meu celular. Estava entupido de mensagens e ligações
perdidas.
—
Estou ferrada, não estou? — resmunguei, deixando o computador de lado.
—
Demi, só você para achar isso ruim — ela disse, desaprovando. — Tudo é tão
incrível!
—
Não se as pessoas ficam inventando coisas a seu respeito e deturpando a
história toda! — Virei o computador para que Selena pudesse tomar conhecimento
do que eu havia acabado de ler.
—
Sinistro, né? — ela admitiu, depois de um tempo. — Mas sem desespero. Isso tudo
é de menos. Achei a cerimônia maravilhosa e você estava linda, serena,
simpática, apesar de meio tímida. O povo te adorou e a imprensa foi à loucura.
Ou seja, está tudo perfeito. Nada de pânico. Querendo ou não, Demi, você vai
ter que se acostumar com a mídia, aqui ou no Brasil. É melhor lidar com essa
sua nova realidade numa boa.
—
Eu sei. Não estou reclamando. O Andrej é um pai maravilhoso e tem feito por mim
tudo o que está ao alcance dele. Acho que, com o tempo, acabo me acostumando —
concordei.
—
E aquela pergunta no final da coletiva? — Selea levantou uma sobrancelha,
desviando completamente o assunto. — Você já pensou na resposta?
—
Ridículo aquele cara. Onde já se viu soltar uma dessas e sair impunemente? Ele
merecia uns bons tapas na cara.
—
Não concordo. Acho que ele merecia um troféu pela coragem de fazer aquela
pergunta. Demi, você tinha que ver sua cara. E a do Joe também.
—
Fala sério, Selena! De que lado você está, afinal de contas? Não quero ficar
falando do Joe, não quero imaginar coisas a respeito dele e nem quero que você
faça isso. Não existe nada entre nós, nem agora, nem nunca. Eu vou voltar para
o Brasil e ele vai ficar aqui. Estou enrolada com o Nick e o Joe tem a Laika.
Sou a filha perdida do rei e o enteado dele não lida bem com isso. Quer mais
algum motivo para parar de falar nele ou já basta? — Terminei meu discurso
quase gritando.
—
Já acabou? — indagou Selena, nem um pouquinho abalada, verificando
concentradíssima as cutículas das mãos. — Pois para mim isso tudo é notícia
velha. Você só não quer admitir, mas está caidinha pelo Joe. Pode tentar
enganar todo mundo, até você mesma, mas não a mim, queridinha, que te conheço
desde sempre.
—
Selena...
—
Não, calma aí que é minha vez de falar — cortou ela, ficando de pé na minha
frente, com as mãos na cintura. — O Nick é um... um... idiota, por falta de
adjetivo melhor. Ou pior, tanto faz. Enquanto você está aqui toda
comportadinha, bancando a namorada fiel, ele está lá, flertando, varando as
noites na balada, cada dia com uma companhia diferente. Eu nem ia te contar
isso, mas acredito que estou no meu papel de melhor amiga aqui.
—
Contar o quê? — indaguei, recostando-me nos travesseiros da cama. — Não estou
assustada nem surpresa, se quer saber.
—
Mas vai ficar agora, porque uma coisa é o cara ciscar feito galinha no terreiro
alheio. — Selena tomou fôlego. Ou foi coragem? — Outra é dar em cima da melhor
amiga da quase-namorada dele. Pronto. Falei.
Abri
a boca, depois fechei e a abri de novo. Mas não consegui falar nada por uns
bons 15 segundos. Então, era por isso que Selena sempre travava quando eu
perguntava a ela sobre Nick. Também, né? Sendo assediada por alguém que deveria
manter uma distância respeitosa, era para ela ficar no mínimo sem jeito, mesmo.
—
Isso é horrível, Selena.
—
É, sim. Mas não foi culpa minha.
—
Claro que não — concordei. Preferi me sentar para digerir melhor a notícia. —
Mas não sabia que o Nick era um desses caras.
—
Eu suspeitei desde o princípio — acrescentou. — Nunca gostei muito dele.
Fiquei
tentando encontrar mentalmente sinais de que o cara por quem eu pensara estar apaixonada
fosse um mulherengo. Eu devia ter sido muito cega.
—
Tudo bem. Na verdade, não estou nem aí. Faz tempo que o Nick é meio que uma
página virada na minha vida e esse lance horroroso não vai me afetar. Ele que
se exploda.
—
É isso aí! — Selena ficou exultante. — Agora, o passo dois é reconhecer para si
mesma que está louca pelo Joe. Tenta, Demi. Você vai se sentir mais leve
depois.
—
Ha, ha, ha! Muito engraçado — desdenhei. Começava a sentir frio só com o
roupão. — Selena, presta atenção. Se eu estivesse... Preste atenção que eu não
estou admitindo nada, só levantando uma hipótese, tá? Caso eu estivesse apaixonada
pelo Joseph, se isso fosse verdade, eu seria a garota mais triste do mundo,
porque, além de ele ter namorada, a Laika é, digamos, um mulherão, e eu não sou
páreo para ela. Além disso, eles estão juntos há bastante tempo e não vejo problemas
no paraíso dos dois. Aliás, não vejo nada, porque eu pouco encontro com ela.
Então, não queira me juntar com o Joe, porque vai dar merda.
—
Laika. Que tipo de nome é esse, pelo amor de Deus?
E
foi com essa indagação forçada que Selena resolveu ignorar meus argumentos
solenemente.
***
O
que um vestido de alta costura não faz por uma mulher! De tanto comprar minhas
roupas do dia a dia na C&A e na Renner, para mim elas eram o que havia de
melhor. Como eu estava enganada!
Uma
peça de grife modifica o corpo — para melhor, óbvio.
Por
ter curvas e ser baixa, é difícil achar um vestido que me favoreça 100%. Mas
juro que o longo da Dior Couture operou milagres em mim.
Patrick
voltou e caprichou no penteado. Ele criou uma coisa meio doida, jogada de lado,
para parecer despenteado, mas eu sei que deu o maior trabalhão para fazer.
Ficou sofisticado.
Nem
sob ameaças eu apareceria sozinha no salão de baile do castelo. Não naquela
noite. Peguei Selena no quarto dela e a fiz de minha acompanhante. Se
dependesse de Irina, eu teria uma entrada triunfal. Faria uma parada
estratégica no topo da escadaria e a música daria uma pausa nesse momento. As
pessoas exclamariam “ohhh” e só então eu começaria a descer os degraus, um a um,
quase em câmera lenta.
Onde
foi mesmo que já vi essa cena, hein? Ah! Em quase todos os filmes bregas. Tô
fora. Mesmo acompanhada por Selena e chegando junto com os convidados — e não
depois, como Irina gostaria —, não consegui evitar os olhares e comentários a
meu respeito. Uns cochichavam, outros falavam alto para eu escutar e todo mundo
queria conhecer melhor a filha do rei Andrej Markov. Dava uma canseira...
Onde
estariam minha mãe e vovó Sue?
Demoravam
tanto! Andrej andava de um lado para o outro, conversando com os convidados,
trocando cumprimentos e apresentando-me para as pessoas.
Selena
me cutucou quando um garçom se postou atrás de nós.
—
Vamos encher a cara? — sugeriu. Seus olhos até brilharam de empolgação.
—
Até parece — desdenhei, revirando os olhos. — Não posso dar mais motivos para
meu nome cair na boca do povo.
—
Só champanhe, então. Por favor... — suplicou ela, com cara de bichinho de
estimação.
Até
que um pouquinho de álcool seria uma boa. Pegamos duas taças e ficamos
bebericando devagar, observando os convidados. Era cada figura!
—
Dá uma olhada naquela mulher. — Fiz sinal para Selena encontrar a direção. —
Está parecendo uma cacatua com aquele vestido de plumas. Branco, ainda por
cima.
Disfarçamos
porcamente uma gargalhada e tivemos que nos virar para não sermos pegas em flagrante.
—
E o chapéu daquela ali. Lembra o obelisco da Praça Sete.
Mais
risadas. Altas.
—
Sacanagem, Selena. Nem está tão alto assim.
—
O barrigudo ali é a cara do Danny DeVito — comentou minha amiga. — Credo, Demi,
gente rica é meio sem noção, né?
Essa
foi a deixa para a entrada de Laika. Contrariando a afirmação de Selena, Nome
de Cachorro abusou do bom gosto para se vestir. Bem que eu gostaria que ela
estivesse parecendo uma palhaça.
Se
a palavra translumbrante existisse,
seria pouco para defini-la. O que fazer quando seu pior pesadelo surge num
vestido longo de cetim vermelho, agarrado ao corpo do busto às panturrilhas,
com uma fenda traseira que terminava a poucos centímetros do bumbum (isso eu vi
depois, mas já estou descrevendo)? Como se não bastasse, a parte superior do
vestido era de uma renda finíssima e transparente e só um top cor da pele
evitava que a bendita estivesse nua na frente de todo mundo.
A
seu lado vinha Joe, num smoking impecável. Mais lindo, impossível. Era a personificação
de Jared Padalecki, astro da série Supernatural,
do Warner Chanel. Primeiro, fiquei sem fôlego. Depois, senti meu coração dar cambalhotas
no peito. Por fim, fiquei vermelha.
Mas
isso aconteceu quando os olhos de Joe encontraram os meus.
—
Demi. Acorda. — Selena me beliscou nas costelas. — Já que não admitiu até hoje
que sente algo pelo Joe, deixa pra depois, tá? Agora não é hora de dar
bandeira. As pessoas estão olhando.
É
por isso que adoro minha amiga. Está sempre me livrando de enrascadas. Desviei
o olhar, desejando nunca ter visto Joseph na minha vida. Por que a existência dele
tinha que mexer tanto com a minha? Não acreditava que estivesse apaixonada por
ele. Não ainda. Mas havia alguma coisa, uma conexão, caso contrário eu não
ficaria tão abalada cada vez que o visse. E nem sentiria tanto ciúme por causa
de Laika.
—
Presumo que aquela seja a Nome de Cachorro — arriscou Selena, de nariz torcido.
Ela também era ótima para comprar minhas brigas.
—
Sim.
—
E aquelas duas perdidas ali devem ser a Dianna e a dona Sue Hart.
Oh!
Nem tinha reparado que mamãe e vovó já haviam chegado. E olha que elas estavam
com Joe.
Nós
quatro nos juntamos numa rodinha e eu me deixei levar pelos comentários em
português que elas faziam sobre o evento. Minha mãe já sabia sobre as notícias
sensacionalistas e não se deixou abalar. Contou que passou a noite recebendo
telefonemas do Brasil, entre eles de jornalistas ávidos por uma entrevista
exclusiva.
—
Até o Fantástico me ligou — disse. — Já pensou, Demi, eu sentada no cenário
deles, com os dois apresentadores contando nossa história e me submetendo a perguntas
invasivas em favor da audiência?
—
Uhg! — Só de imaginar a cena, tive náuseas. — Mãe, você está proibida de dar entrevistas.
Aliás, as três estão. A não ser que seja uma coisa séria. Não vamos fazer disso
tudo um circo de horrores. Combinado?
—
É claro, filha. Essa hipótese não está sendo nem mesmo cogitada — garantiu
mamãe. — E, a propósito, você está lindíssima. Como eu nunca consegui fazer
você usar um desses antes?
Aposto
que é obra da Irina.
Engraçado.
Era para eu ficar feliz com o elogio, mas acabei fazendo comparações, vocês sabem
com quem. De repente, meu Dior Couture se transformou numa roupinha sem graça.
—
E deve ter custado uma fortuna — completou vovó, admirada. — O Andrej faz tudo por
você, não é mesmo?
—
Sim. — Não consegui evitar uma olhada na direção dele. Demonstrava estar tão
feliz. — Ele é demais, vó. Mãe, você foi uma boba. É difícil encontrar um homem
como meu pai no mercado, sabia?
Ela
fez uma careta.
—
E eu não sei? Por que você acha que estou solteira até hoje?
É.
Não fazia mesmo sentido. Mesmo linda e bem cuidada, minha mãe nunca namorava.
Ou melhor, até já tinha namorado, sim, mas jamais ficava com uma cara por muito
tempo. Agora eu sabia por quê. Era absolutamente impossível existir alguém
igual a Andrej.
—
Vocês vão me perdoar, mas demais mesmo é o Joe — comentou vovó, com a voz lotada
de malícia. — A Dianna está de prova e não vai me deixar mentir nem exagerar.
Ele nos tratou com a maior delicadeza. Conversou conosco o tempo todo durante o
trajeto de ida e volta, foi gentil abrindo e fechando portas para nós e até nos
convidou para conhecer o apartamento dele, mas isso nós tivemos que negar por
pura falta de tempo. Agora, na volta, mesmo com a namorada esnobe dele, o Joe
procurou ser simpático e demonstrou estar bastante interessado no nosso bem-estar.
Estou mentindo, Dianna?
—
Não, mamãe. Isso tudo é verdade. Ele é uma ótima pessoa. Bom, pelo menos é o
que parece.
Meu
Deus do céu! Por que tudo acabava levando a Joseph?
—
Mas a tal da Laika é bem estranha — vovó completou.
Saber
que essa opinião era um ponto em comum entre nós quatro me deixou mais
tranquila. Pelo menos, não era eu a implicante.
A
conversa terminou quando Andrej me pegou para desfilarmos juntos pelo salão.
Hora de fazer um social. Fomos andando de mesa em mesa, dando atenção aos
convidados, que, afinal de contas, estavam ali para me prestigiar. Mas que trabalhinho
cansativo! Se antes minhas bochechas doíam, agora gritavam. Não é fácil manter
um sorriso na cara por mais de 15 minutos.
E
eu conheci gente para caramba, de tudo o quanto é lugar. Mas não me perguntem
quem era quem que eu levaria uma vida para reconhecer todos.
Foi
numa dessas andanças pelo salão que topamos com Joe e Laika. Pretendia ignorá-los
por pelo menos mais uma ou duas horas. Contudo, me dei mal.
—
Demi — ele disse de forma polida.
—
Joe — fiz o mesmo.
—
Majestade. — Já Laika era só sorriso, mas um daqueles bem falsos. — Sua festa
está linda. E, Demi, acompanhei tudo pela TV e posso garantir que você foi
muito bem.
Fingida...
—
Seu vestido estava um arraso — continuou ela. — E esse também é demais. Você
está uma graça.
Entendi
a estratégia dela. Laika preferia gastar elogios comigo a deixá-los para o
namorado. Ela falava, ele ficava calado. Garota esperta.
—
Obrigada — murmurei. E me obriguei a retribuir: — O seu também é ótimo.
Pensando
que estava me fazendo um grande favor, Andrej arrastou Joe de perto de nós, com
a desculpa que “as meninas querem fofocar”. Acabei ficando sozinha com Nome de
Cachorro.
Um
silêncio pesado pairou sobre nós, daqueles que são difíceis de administrar. Eu
não tinha a menor vontade de trocar amenidades com Laika ou falar do tempo,
muito menos saber da vida pessoal dela. Só uma curiosidade martelava minha
cabeça: se ela fazia planos de sumir do mapa a curto prazo. Mas isso eu não me
arriscaria a perguntar. Foi a própria Laika quem quebrou o silêncio.
—
Pretende ficar muito tempo na Krósvia? — Pelo jeito a mesma dúvida que eu tinha
também atormentava Nome de Cachorro.
—
Planejei passar seis meses aqui — esclareci casualmente. — Devo voltar para o Brasil
depois do Carnaval.
—
Carnaval? — ela repetiu. — Aquela festa em que as pessoas, bem... se liberam?
Enruguei
a testa, preparando-me para defender nossa mais tradicional comemoração, embora
eu mesma tenha um pouco de resistência a ela — não aos dias que fico de folga,
que fique claro. Mas não era essa a verdade? Dizer que o povo se libera é até
eufemismo. Todo mundo solta as frangas, isso sim.
—
Acontece em que mês? — Laika quis saber, sem me dar tempo para responder à pergunta
anterior.
—
No ano que vem vai cair no meio de fevereiro. É que ela varia de ano para ano —
expliquei, crente que estava agradando.
—
Então, ainda está longe.
Que
bela oportunidade para soltar uma frase de duplo sentido! Para qualquer um,
soaria como se Laika estivesse se referindo ao Carnaval. Mas não para meu sexto
sentido. Tudo me levava a crer que ela estava lamentando o tempo que ainda faltava
para eu partir para longe e de vez.
—
Passa rápido. — Adorei minha ironia. De vez em quando eu adoro usar uma.
Novo
silêncio. Por que eu não aproveitava para dar o fora dali? Meus neurônios
começaram a processar uma desculpa com a qual eu pudesse escapulir.
Foi
aí que Laika deixou a máscara sair do lugar.
—
Demi, se me permite ser sincera — Laika assumiu uma postura felina, como se a
qualquer momento fosse enfiar as garras em minha cara —, sei que tem passado
muito tempo com o Joe. O fato de vocês terem o rei Andrej em comum acabou forçando
uma proximidade, que eu considero próxima até demais.
Meu
sangue sumiu de repente. Será que Nome de Cachorro estava concluindo que eu
queria alguma coisa com o namorado dela? Alguma coisa como querê-lo para mim?
Que viagem! Né?
—
Vocês têm ficado muito tempo juntos, mas eu sei que é porque o Andrej confia no
Joe. — Laika tratou de justificar seu comentário. Notei que ela desejava me
alfinetar e demarcar claramente seu território, mas sem parecer possessiva e
ciumenta. Afinal, para que perder tempo com uma garota como eu? — O Joe tem faltado
ao trabalho, mas também tem dias que ele fica até tarde no escritório para
compensar as ausências. Você já deve saber que ele é um arquiteto muito
requisitado e esses sumiços soam mal para a carreira dele.
Que
feio, Laika! Usar o trabalho do cara para disfarçar seu ciúme.
Isso eu só pensei, mas não seria o máximo jogar na cara dela?
—
Bom, eu só aceitei essa situação porque meu pai insistiu e, se me permite
dizer, Laika, a ideia foi do próprio Joe. Imaginei que ele devia saber o que
estava fazendo, afinal ele é um homem adulto. — Falei bem devagar, pisando em
ovos, de modo que ela não tomasse minhas palavras como uma afronta. Embora
fossem.
Ela
riu com escárnio.
—
O Joe nunca sabe o que está fazendo, Demi. Ele vive querendo ajudar as
pessoas, mas acaba se prejudicando. Sempre foi assim e eu já fiz de tudo para
abrir os olhos dele.
Que
bruxa manipuladora! Como alguém de espírito livre como Joseph podia se envolver
com uma pessoa egoísta e mimada como aquela garota demonstrava ser?
—
Então, você está sugerindo que...
—
Eu estou tentando pedir seu apoio para que o
Joe desista desses passeios — ela me cortou, enfatizando cada palavra
proferida. — Afinal de contas, acredito que você queira o melhor para ele, já
que são quase irmãos, não é mesmo?
Meu
rosto enrubesceu com o choque. Aquela Laika não tinha apenas nome de cachorro.
Ela era uma cadela por inteiro. Querendo me tirar da jogada com aquela
conversinha, ainda por cima buscando minha empatia. Sério?
—
É melhor acabar com isso de uma vez, antes que o Joe perca todos os clientes.
Acho que você não gostaria de vê-lo numa situação complicada. Não é mesmo? —
completou.
Se
eu não soubesse, ninguém precisaria me dizer que o pai de Laika era um
político, considerando quanto ela era persistente na persuasão.
—
Olha, Laika, não quero prejudicá-lo, mas vou deixar essa decisão para o próprio
Joe — afirmei, já bastante desconfortável com a situação.
—
Talvez conversando, você e ele cheguem a um acordo. Eu prefiro ficar fora
disso, certo?
—
Ficar fora disso. Seria mesmo uma boa ideia. — Ela também podia ser a rainha da
ambiguidade, além de Nome de Cachorro.
Jesus!
Que tipo de pessoa era aquela, que usava o lado mais fraco da corda para tentar
se dar bem? Mas eu não deveria estar nem um pouco surpresa. Toda história de
princesa tem uma megera e ela normalmente é bonita e extremamente má. Como
minha vida estava mais para um conto de fadas do que realidade, já era hora de
minha bruxa aparecer, já que nem tudo pode ser um mar de rosas, infelizmente.
—
Sobre o que vocês duas tanto conversam?
Joseph.
Sempre oportuno!
A
máscara de cachorra boazinha de Laika voltou para o mesmo lugar de antes. Eu
que não consegui recolocar a minha, digo, não consegui recuperar meu humor, que,
se antes não estava bom, pelo menos não era negro. Tremia de cima a baixo e
deveria estar até abatida. Discussões sempre acabam comigo, sejam elas veladas
ou não.
—
Segredinhos femininos, não é, Demi? — cantou ela, altiva.
Elevei
meu olhar e a encarei. Laika havia perdido a beleza. Vestidos justos, corpo
perfeito, rosto de anjo, nada disso tem significado quando o caráter é uma
porcaria.
—
Nada disso — retruquei, com um sorrisinho falso. — Besteiras femininas, não é?
Deixei
os dois, doida para fugir do baile e chorar sozinha no meu canto.
~*~
DESCULPEM A DEMORA, MAS NÃO ESTOU NEM TENDO TEMPO PRA DORMIR, IMAGINEM PRA POSTAR AQUI D: Cara, estou lotada de projetos e trabalhos na faculdade... Cursar arquitetura em uma das melhores faculdades de arquitetura do país não é fácil não hahah Mas enfim, só queria que soubessem que não vou abandonar o blog e que vou postar sempre que eu puder, ok?!
Ah, e obrigada pelos selinhos, meninas (: vou postar eles aqui depois, porque estou correndo contra o tempo agora... tenho reposição de aula hoje (sábado) e ainda tenho que ler um texto sobre a matéria )':
Anyway, comentem muito ;D Vejo vocês em breve. <4