Joe.
Ok, eu não deveria ter detonado a garota, na tal apresentação.
Sábado à noite... Você e eu... Aulas de direção e sexo ardente...
Escrever isso no caderno dela provavelmente não foi uma manobra
inteligente. Mas eu estava louco para fazer a Pequena Miss Perfeição vacilar,
quando me apresentasse à classe... E ela está vacilando!
— Srta. Ellis?
A Pequena Miss Perfeição olha para Peterson e eu observo
tudo, me divertindo muito. Oh, ela é ótima... Essa minha parceira sabe como
esconder suas verdadeiras emoções, coisa que reconheço muito bem, porque faço
isso o tempo inteiro.
— Sim? — diz Demetria, inclinando a cabeça e sorrindo como se fosse
a rainha da beleza. Será que ela continuaria a sorrir assim, se recebesse uma
multa por excesso de velocidade?
— É sua vez. Apresente Joe à classe.
Apoio o cotovelo na mesa, esperando para ver: será que Demetria
vai mesmo fazer a tal apresentação, ou vai confessar que não sabe nada a meu
respeito? Ela me olha: estou sentado, confortavelmente... Vejo, por seu olhar
de ansiedade e pânico, que consegui deixá-la bastante perturbada.
— Este é Joseph Fuentes — ela começa, com um leve tremor na voz.
Fervo por dentro enquanto ela diz meu nome de batismo, mas mantenho a pose
durante a apresentação.
— Nesse verão, enquanto não estava vagabundando pelas esquinas ou
perturbando pessoas inocentes, ele fez uma turnê pelas cadeias da cidade, se
é que vocês me entendem. Mas Joe tem um desejo secreto que ninguém, jamais,
poderia imaginar.
De repente, a classe inteira fica em silêncio. Até mesmo a Sra.
Peterson está ligada... Que inferno! Escuto as palavras mentirosas, brotando
dos lábios pink de Demetria... E elas parecem verdadeiras!
— O desejo secreto de Joseph Fuentes... — ela continua — é ir para
a Universidade e tornar-se um professor de Química, assim como a Sra. Peterson.
Ok, tudo bem. Olho para minha amiga Mi, que parece se divertir ao
ver que a garota branca não tem medo de me provocar, diante de toda a classe.
Demetria me lança um sorriso triunfante, pensando que ganhou este round.
Tente outra vez, gringa.
Eu
me levanto, enquanto a classe continua em silêncio.
— Esta é Demetria Ellis — digo, agora com todos os olhares
voltados para mim. — Nesse verão, ela foi ao shopping, comprou muitos modelos
novos para incrementar seu guarda-roupa e gastou o dinheiro do papai numa
cirurgia plástica, para melhorar sua... — faço uma pausa de efeito, antes de
terminar: — fachada.
Pode não ser o que ela escreveu... Mas, provavelmente, isso está
bem perto da verdade... Ao contrário da apresentação que ela fez sobre mim.
Meus amigos riem, no fundo da sala.
Demetria está a meu lado, dura como uma tábua; parece que minhas
palavras feriram seu precioso ego.
Demetria Ellis está acostumada a ser bajulada por todo mundo...
Mas bem que podia acordar, de vez em quando. Estou realmente lhe prestando um
favor. E mal sabe ela que ainda não terminei a apresentação.
— Seu desejo secreto... — acrescento, provocando em Demetria a
mesma reação que ela provocou em mim, quando me apresentou — é namorar um mexicano,
antes da formatura.
Tal como eu esperava, minhas palavras provocam comentários e
alguns assovios, no fundo da sala.
— Muito bem, Fuentes! — grita meu amigo Lucky.
— Quer namorar comigo, gracinha? — diz outro.
— Toque aqui... — Ergo minha mão espalmada. Marcus, outro membro
da Sangue Latino, sentado logo atrás de mim, faz o mesmo. Batemos nossas
mãos, uma contra a outra, e é então que percebo Mi, meneando a cabeça, como se
eu tivesse feito algo errado... Ora, estou apenas me divertindo com uma garota
rica da zona norte.
Demetria olha para Colin e depois para mim. Encaro Colin e, com os
olhos, lhe digo: o jogo começou. No mesmo instante ele fica vermelho
como uma pimenta. Definitivamente, acabo de invadir seu território. Ótimo!
— Silêncio, classe! — diz a Sra. Peterson, num tom ríspido. —
Agradeço as apresentações, muito criativas e... esclarecedoras. Quanto à Srta.
Ellis e ao Sr. Fuentes... Façam o favor de conversar comigo, depois da aula.
Fui clara?
— Além de causar espanto, a apresentação de vocês foi uma falta de
respeito, tanto para mim quanto para seus colegas — diz a Sra. Peterson, após a
aula. Eu e Demetria estamos diante da mesa dela. — Vocês têm uma alternativa...
— Ela pega dois daqueles formulários azuis, de suspensão. Com a outra mão,
segura nossos cadernos. — Vocês podem receber uma suspensão, hoje, ou então
escrever, a mão, um ensaio de quinhentas palavras sobre “respeito” para amanhã.
O que vão escolher?
Escolho o formulário da suspensão. Demetria — veja só! — escolhe o
caderno.
— Vocês têm alguma objeção quanto ao critério que usei para
escolher os parceiros de Química? — pergunta a Sra. Peterson.
Demetria responde “sim” enquanto eu, ao mesmo tempo, digo “não”.
A Sra. Peterson tira os óculos, colocando-os sobre a mesa:
— Escutem, é melhor que vocês resolvam suas
diferenças, antes do final do ano letivo. Demetria, eu não vou trocar o seu
parceiro. Vocês dois estão no último ano do curso secundário e terão que lidar
com muitas pessoas, de personalidades bem diferentes, depois que se formarem.
Se não quiserem frequentar o curso de verão, depois de serem reprovados em
minha matéria, sugiro que trabalhem juntos, em vez de entrarem em conflito.
Agora, tratem de se apressar para a próxima aula.
Com isso, saio da sala de Peterson e caminho
ao lado da minha parceira de Química pelo corredor.
— Pare de me seguir — diz Demetria,
asperamente, olhando por sobre o ombro para ver se alguém está nos observando.
...Como se eu fosse el
diablo em pessoa!
—
Use mangas compridas, no sábado à noite... Faz muito frio, na garupa da minha
moto. E você pode pegar uma gripe — digo, sabendo que ela está no limite da sua
sanidade. Não costumo mexer com garotas brancas, mas até que estou gostando de
provocar esta, a mais popular, a mais cobiçada, entre todas... Ela realmente me
interessa.
—
Escute, Joe... — diz Demetria, virando-se de súbito para mim, com aqueles
cabelos, que parecem ter sido beijados pelo sol, caindo abaixo dos ombros. Ela
me encara, com uma expressão gélida nos olhos claros. — Não costumo sair com
garotos de gangues. E não uso drogas.
— Eu
também não saio com garotos de gangues — digo, me aproximando dela ainda mais.
— E não sou usuário de drogas.
—
Sim, tudo bem; me surpreende o fato de você não estar numa clínica de
recuperação, ou num reformatório para delinquentes juvenis.
—
Você acha que me conhece, não é mesmo?
—
Conheço o suficiente. — Ela cruza os braços, mas então olha para baixo, como se
percebesse que essa postura faz com que seus peitos pareçam bem maiores... E
solta os braços ao longo do corpo.
Eu
me esforço ao máximo para não focar esses peitos, enquanto avanço mais um
passo.
—
Você me entregou para o Aguirre?
Ela
recua um passo:
— E
daí, se eu fiz isso?
— Mujer,
você está com medo de mim. — E isto não é uma pergunta. Só quero ouvir, dos
próprios lábios de Demetria, o motivo desse medo.
— A
maioria dos alunos deste colégio têm medo de olhar para você de um jeito
“errado” e levar um tiro... Se é que você me entende.
— Se
isso fosse verdade, minha espingarda estaria soltando fumaça, neste exato
momento... Então, por que você não está fugindo deste mexicano durão,
hein?
—
Dê-me uma pequena chance de fazer isso... E eu farei.
Bem, já perdi tempo demais com essa
cadelinha. É hora de me aprumar e mostrar quem é que manda aqui. Diminuo ainda
mais a distância entre nós e murmuro em seu ouvido:
— Encare os fatos, garota: sua vida é muito
perfeita.
Você provavelmente acorda no meio da noite... E fica fantasiando sobre o que
fazer para tornar um pouco mais animado aquele lugar imaculado onde você
vive...
Mas,
droga, sinto um cheiro de baunilha, que talvez venha do perfume que ela usa.
Isso me faz lembrar de uns biscoitos... Adoro biscoitos, o que significa que
eles não são muito bons.
—
Ficar perto do fogo, niña, não significa, necessariamente, que você vai
se queimar.
—
Toque nela e se arrependerá amargamente, Fuentes — Colin avisa. Ele parece um
burro, com seus grandes dentes brancos e as orelhas despontando em meio ao
ridículo corte de cabelo. — Trate de ficar bem longe dela.
—
Colin... — diz Demetria — tudo bem... Posso lidar com isso.
O Cara
de Burro trouxe reforços: três outros caras de cara branca e pastosa, que
se colocam em volta dele, formando uma retaguarda. Observo Cara de Burro e
seus amigos, para ver se sou capaz de dar conta de todos... Não vai ser fácil,
mas acho que posso derrotá-los.
—
Ouvirei suas asneiras quando você tiver tamanho para jogar nos grandes times,
garoto — eu digo.
Alguns
estudantes formam um círculo à nossa volta, deixando-nos espaço para a briga,
que promete ser rápida, furiosa e sangrenta. Mal sabem eles que o Cara de
Burro sempre foge desses confrontos. Mas, agora, que tem retaguarda, talvez
resolva encarar...
Estou
sempre preparado para o perigo; já briguei muitas vezes, nessa vida. Tenho
cicatrizes que provam isso.
—
Colin, não vale a pena brigar com ele — diz Demetria.
Oh,
obrigado, gracinha. Então você voltou?
—
Você está me ameaçando, Fuentes? — grita Colin, ignorando a namorada.
—
Não, imbecil — respondo, encarando-o. — Apenas caras frouxos, como você, fazem
ameaças.
Demetria
se coloca na frente de Colin e põe a mão em seu peito.
—
Não ligue para ele — diz ela.
—
Não tenho medo de você. Meu pai é advogado — Colin se gaba, enlaçando Demetria.
— E esta garota é minha. Nunca se esqueça disso.
—
Então, veja se consegue controlar a menina... — eu aviso senão, é capaz dela
ficar tentada a encontrar outro dono.
Meu
amigo Paco se aproxima:
—
Tudo bem, Joe?
—
Sim, Paco — respondo, um momento antes de ver dois professores se aproximando
pelo corredor, acompanhados por um policial. É isso que Colin Adams quer: me dar um bom chute no traseiro e me
expulsar deste colégio. Não vou cair nessa armadilha; não quero acabar na lista
negra de Aguirre.
— Sim, tudo bem. — Eu me viro para Demetria.
— Vejo você mais tarde, gracinha. Estou
ansioso para fazer uma pesquisa sobre a nossa química.
Demetria
ergue o queixo, com ar superior, e me olha como se eu fosse a escória da raça
humana... Eu me afasto e, assim, me livro de uma segunda suspensão.
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